sábado, janeiro 12, 2013

Para assistir Cloud Atlas




Faz tempo que desejava escrever. Não saía. Faltava coragem. Tinha feito o menino crescer.
Não há pausa pra ser menino nesta vida de guerreiro. E a vida ia passando...
Tomei coragem (e um pouco de vinho) e comecei.
É tanto pensar, tanto sentir, tanto pesar. Acabei me acostumando ao ritmo descuidado e fui esquecendo de ouvir, de parar. Há outra história...
Precisava de um tempo doce, tranqüilo, sonhar. E teimando como bom taurino, deixei de lado a realidade e fui descansar no cinema. Eu queria ouvir, ver, sorrir, chorar. Precisava de emoções.
Faz tempo que filmes não me saem da cabeça. Timidez curitibana mesclada com histórias de ausências produziram alguém que gosta de ouvir, ver e ler histórias. Sempre questionei o real, aprendi logo que pra existir eu precisava ser inventor. A vida não completava. Eu sobrava. Era o 12º jogador que ninguém queria nem como gandula, nunca cabia nos trabalhos em grupo, na família sempre um bom órfão. Com o tempo, a gente cresce e finge. Somos todos iguais. E eu estou aqui, de novo sem palavras pra contar o que senti. Talvez seja que ainda não inventaram um idioma pra traduzir um momento de reconhecimento de semelhantes.
Richard Bach me contou que “os semelhantes se atraem, é uma lei cósmica”. Sem dúvida, estava certo. Eu fui atraído. Logo que a música inicia, um taurino pressente que valerá a pena. Músicas fazem parte de nosso kit básico de sobrevivência. A história começa, ou melhor, são muitas histórias. Cada qual num período, futuro, passado, presente deixam a velha convenção linear conhecer as vantagens de ser círculo. E eu que adoro rodar, pressinto que haverá água. Há tempos, deixei de preocupar-me com as insistentes ondinhas que escorrem dos olhos. Se não fosse pra escorrer, no lugar de glândulas lacrimais haveria uma barragem. Não sou represa, enfim. E era tudo tão cheio de sentido! Tantxs personagens, tantas vidas, tantas dores e tantos sentimentos, que eu bem que caberia ali também. Ouvia as falas e no meio de um diálogo qualquer, era presenteado: uma frase atemporal. Algumas que fazem sentido apenas porque eu já descobri antes, outras porque de tão especiais eram simples e faziam explodir a lembrança semelhante.

Ser é ser percebido”. “Todas as fronteiras são convenções”. “Limites existem para serem transgredidos”.
Outra peripécia era que a cada cena que me comovia, a timidez e a vergonha eram derrotadas. Eu sorria, ria alto da fuga de quatro velhinhxs companheirxs que aprenderam que riscos valem a pena pelo que se acredita, chorava pelo encontro amoroso de dois rapazes e seu amor-vitória, indignava-me com o terror de um capitalismo ainda mais destrutivo (sim, tudo pode piorar, basta continuar do jeito que está), acreditava na moça “fabricada” que aprendeu a ser revolucionária quando descobriu que não era “só mais uma”, preenchia-me quando amigos aprendiam que amizade não existe sem solidariedade e que cor da pele é só pintura  e me encontrava quando valia a pena continuar com a verdade, mesmo que ninguém ouvisse, porque alguém já acreditava, afinal se “somos apenas uma gota no oceano quando desafiamos a ‘ordem natural das coisas’ mas... o que é o oceano mesmo senão uma infinidade de gotas d’águas?
São atores e atrizes de primeira qualidade em tantos papéis! O melhor é perceber (ao longo do filme só pra quem já está acostumadx a transgressão) que são mais personagens que o elenco. A conta só fecha porque atores e atrizes fazem várixs personagens, e reside aí mais uma mágica dádiva. Ninguém é só homem ou só mulher, ninguém é só negro ou só branco, ocidental ou oriental, hetero ou homo. Num simples ato de fazer atuações diversas, Lana e Andy mostram que é possível (portanto real) não ser só isso ou aquilo. Sejam e seremos o que desejarmos. Eu saí completo. Eu existia de verdade. Pelo menos naquelas três pequenas horinhas, naquela sala escura, na poltrona rigorosamente escolhida pra ser solitária, eu estufei o peito e senti: Eu posso ser!
E o final. É a esperança. Talvez seja só uma possibilidade, mas vale a pena. Era isso que eu buscava quando comprei o ingresso.
Ao sair eu estava naquele estado de inquietação, a tristeza era a mais feliz de todas e a felicidade era melancólica porque eu era inteiro de novo. De volta pra casa, voltando a crescer, lembrei que o menino só precisava acreditar que o guerreiro não estava sozinho. Pedalando e pensando, ouvindo a trilha sonora que tinha acabado de conhecer, fechei os olhos e desejei apenas um abraço mais que apertado em Lana e Andy. Como aprendemos juntxs, estamos todxs conectadxs. Por fim, Descobri que a palavra que eu procurava pra dizer o que pensava de seu filme era apenas “obrigado”.


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