Faz tempo que desejava escrever.
Não saía. Faltava coragem. Tinha feito o menino crescer.
Não há pausa pra ser menino nesta
vida de guerreiro. E a vida ia passando...
Tomei coragem (e um pouco de
vinho) e comecei.
É tanto pensar, tanto sentir,
tanto pesar. Acabei me acostumando ao ritmo descuidado e fui esquecendo de
ouvir, de parar. Há outra história...
Precisava de um tempo doce,
tranqüilo, sonhar. E teimando como bom taurino, deixei de lado a realidade e
fui descansar no cinema. Eu queria ouvir, ver, sorrir, chorar. Precisava de
emoções.
Faz tempo que filmes não me saem
da cabeça. Timidez curitibana mesclada com histórias de ausências produziram
alguém que gosta de ouvir, ver e ler histórias. Sempre questionei o real,
aprendi logo que pra existir eu precisava ser inventor. A vida não completava.
Eu sobrava. Era o 12º jogador que ninguém queria nem como gandula, nunca cabia
nos trabalhos em grupo, na família sempre um bom órfão. Com o tempo, a gente
cresce e finge. Somos todos iguais. E eu estou aqui, de novo sem palavras pra
contar o que senti. Talvez seja que ainda não inventaram um idioma pra traduzir
um momento de reconhecimento de semelhantes.
Richard Bach me contou que “os
semelhantes se atraem, é uma lei cósmica”. Sem dúvida, estava certo. Eu fui
atraído. Logo que a música inicia, um taurino pressente que valerá a pena.
Músicas fazem parte de nosso kit básico de sobrevivência. A história começa, ou
melhor, são muitas histórias. Cada qual num período, futuro, passado, presente
deixam a velha convenção linear conhecer as vantagens de ser círculo. E eu que
adoro rodar, pressinto que haverá água. Há tempos, deixei de preocupar-me com
as insistentes ondinhas que escorrem dos olhos. Se não fosse pra escorrer, no
lugar de glândulas lacrimais haveria uma barragem. Não sou represa, enfim. E
era tudo tão cheio de sentido! Tantxs personagens, tantas vidas, tantas dores e
tantos sentimentos, que eu bem que caberia ali também. Ouvia as falas e no meio
de um diálogo qualquer, era presenteado: uma frase atemporal. Algumas que fazem
sentido apenas porque eu já descobri antes, outras porque de tão especiais eram
simples e faziam explodir a lembrança semelhante.
“Ser é ser percebido”. “Todas as fronteiras são convenções”. “Limites
existem para serem transgredidos”.
Outra peripécia era que a cada
cena que me comovia, a timidez e a vergonha eram derrotadas. Eu sorria, ria
alto da fuga de quatro velhinhxs companheirxs que aprenderam que riscos valem a
pena pelo que se acredita, chorava pelo encontro amoroso de dois rapazes e seu
amor-vitória, indignava-me com o terror de um capitalismo ainda mais destrutivo
(sim, tudo pode piorar, basta continuar do jeito que está), acreditava na moça
“fabricada” que aprendeu a ser revolucionária quando descobriu que não era “só
mais uma”, preenchia-me quando amigos aprendiam que amizade não existe sem
solidariedade e que cor da pele é só pintura e me encontrava quando valia a pena continuar
com a verdade, mesmo que ninguém ouvisse, porque alguém já acreditava, afinal
se “somos apenas uma gota no oceano
quando desafiamos a ‘ordem natural das coisas’ mas... o que é o oceano mesmo
senão uma infinidade de gotas d’águas?”
São atores e atrizes de primeira
qualidade em tantos papéis! O melhor é perceber (ao longo do filme só pra quem
já está acostumadx a transgressão) que são mais personagens que o elenco. A
conta só fecha porque atores e atrizes fazem várixs personagens, e reside aí
mais uma mágica dádiva. Ninguém é só homem ou só mulher, ninguém é só negro ou
só branco, ocidental ou oriental, hetero ou homo. Num simples ato de fazer
atuações diversas, Lana e Andy mostram que é possível (portanto real) não ser
só isso ou aquilo. Sejam e seremos o que desejarmos. Eu saí completo. Eu
existia de verdade. Pelo menos naquelas três pequenas horinhas, naquela sala
escura, na poltrona rigorosamente escolhida pra ser solitária, eu estufei o
peito e senti: Eu posso ser!
E o final. É a esperança. Talvez
seja só uma possibilidade, mas vale a pena. Era isso que eu buscava quando
comprei o ingresso.
Ao sair eu estava naquele estado
de inquietação, a tristeza era a mais feliz de todas e a felicidade era
melancólica porque eu era inteiro de novo. De volta pra casa, voltando a
crescer, lembrei que o menino só precisava acreditar que o guerreiro não estava
sozinho. Pedalando e pensando, ouvindo a trilha sonora que tinha acabado de
conhecer, fechei os olhos e desejei apenas um abraço mais que apertado em Lana
e Andy. Como aprendemos juntxs, estamos
todxs conectadxs. Por fim, Descobri que a palavra que eu procurava pra
dizer o que pensava de seu filme era apenas “obrigado”.
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